quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Um carnaval - parte um





Extasiados.

Estava eu com mais três amigas no trevo de Uberlândia com a finalidade de pegar carona até o carnaval de Diamantina. Era manhã de sexta-feira, e não havia muito sol, um ótimo clima para pegar estrada de mochilas cheias e peito aberto. Um carro parou, um gol branco quadrado com um rapaz no volante, nossa primeira carona do dia, e o melhor de tudo é que fomos os quatro dentro.

Era um rapaz jovem, um pouco mais velho do que a gente e viajava a trabalho. Deixou os caronistas logo na primeira cidade, Patrocinio. São coisas de pegar carona, não podemos esperar chegar de primeira, na estrada não há horários e nem garantias, mas tudo estava mais do que perfeito, afinal já havíamos caminhado alguns bons kms em uma boa velocidade.

No trevo de Patrocinio decidimos nos separar, Breila e Aline ficaram em um lado do trevo, e mais alguns metros adiante ficamos eu e Roberta. Não deu meia hora, eu e Roberta conseguimos um homem num Fiat uno preto com sua mãe ao lado no passageiro. Era um tipo moreno, baixo e magro com seus trinta e poucos, lembrava esses orientais meio indiano meio norte africano, como saído de filme sobre a paixão de Jesus Cristo. Tentamos entrar os quatro no carro, mas não havia como devido a bugigangas do homem do uno, eram malas. Fomos eu e Roberta, rumo a alguns kms mais perto de nosso destino.

Conversamos no carro, dessas conversas de carona. De onde vem? O que fazem? Para onde vão? Entre esses relatórios, são fornecidas também sugestões, opiniões, entramos em contato com pessoas que nunca mais encontraremos, que apesar de serem fundamentais para aquele momento, não se tornarão mais do que memórias, encontramos mundos próprios, conhecemos festividades e rumos, visões de mundo e sentimentos, percebemos a vastidão do mundo e as belezas do seres humanos, somos capazes de estabelecer contato com seres que promovem suas existências e sobrevivências de maneira muito destoante das nossa. Mas, continuemos com a história, que fique o elogio a transcendência das caronas mais pra frente.

Eram evangélicos, o homem e sua mãe no fiat uno. Conversamos religião e sociedade. A mulher, perto talvez dos 60, falava menos, ouvia mais, talvez mais sábia. Aprendi, desde o começo de minhas jornadas, que conversar com o carona é fundamental para estabelecer um vínculo mais próximo, para quebrar o medo "dos outros" que temos, para demonstrar gratidão, respeito e cumplicidade, e eu falo bastante com estranhos, e gosto de ouví-los e conhecer suas histórias, algumas fantasticamente comuns e apaixonantes. Embora um pouco mais reservada, Roberta também participava da conversa sem deixar de lado suas opiniões e posições.

A carona ia bem, o homem do Uno nos deixaria em Patos de Minas, e mais uma vez fomos de carro e a uma boa velocidade. Ele nos deixou num posto policial a uns kms depois da cidade por julgar que conseguiríamos carona mais facilmente pelo fato de que os carros ali passam devagar.

Descemos, agradecemos, nos cumprimentamos e nos desejamos um bom "tudo de bom". Havia um posto de conveniência por perto, fomos atrás de água, ainda havia muita estrada no caminho. Fiquei pensando em Aline e Breila, em que ponto estariam e como, Aline era uma explosão em forma de mulher, exalava a energia da juventude com suas risadas e era frenética como uma batida de funk, usava dreads no cabelo e tinha uma tatuagem de escorpião no ombro esquerdo, tatuagem pequena com cara de venenosa, naquele corpo de italiana do interior de São Paulo, Breila era uma baixinha carismática, com uma mente solta e um sorriso aberto, aos 18, parecia uma menina de cabelo curto vivendo sonhos de muitas energias positivas. Eram irmãs de vida, a tampa e a panela, duas jovens buscando alternativas a reles existência, não temia por elas, queria saber as histórias.

Roberta se predispôs a buscar água enquanto eu "bolava" um cigarro de palha. Água. Santo remédio nas estradas desse mundo, nos refrescamos e continuamos a exibir nossos dedões e carinhas de cachorro que caiu da mudança aos carros que passavam na rodovia.

Meia hora depois, sem ainda nada conseguir, avistamos um Fiat Uno preto com nosso mais novo amigo evangélico. Parou do nosso lado, desceu do carro, e entregou-me minha máquina fotográfica, uma cybershot da sony que tenho, relíquia. Eu havia esquecido no banco de trás do carro do nosso amigo de estrada.

Eele esvaziou o carro, retirou suas malas e encontrou a capa preta da minha sony, sem saber se iria me achar, decidiu voltar e andar mais alguns kms em direção ao posto policial para devolver a aquele jovem cabeludo, que mais parecia uma versão paraguaia de Jesus Cristo, sua máquina fotográfica. Devolveu, mais cumprimentos e agradecimentos e cada um seguiu seu rumo, o altruísta e os caronistas.

São coisas que acontecem nas caronas, na estrada, livres e a mercê de infinitas possibilidades e pessoas, tão belas e humanas quanto nós mesmos. Mas a viagem, estava apenas começando.


continua

Gabriel Oliveira

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Relatos de viagem. Essa história continua. Não pego mais carona, mas era bom quando tudo dava certo, parecia benção dos Deuses. Breila, Aline e Roberta, peço licença para continuar a história e agradeço publicamente as alegrias compartilhadas.

Grande Abraço, Gabriel Oliveira

3 comentários:

Nathália Fernandes disse...

Hahá.
Bate curiosidade.
Conta logo, conta.

Gabriel Oliveira disse...

Contarei, Nathália. Obrigado por ler! Abraço, Gabriel.

Lê Gallo disse...

Sorte de principiante, meu caro amigo,... sorte de principiante.
O q saia de ti voltava em dobro.
Bons tempos tb passei assim.