sábado, 30 de outubro de 2010

Em fragmentos, a esperança

O tempo parece parar. O instante parece tudo que temos. E não é pouco, há muito no momento. Parece que se ouvirmos o instante não se cala, se estivermos prontos para navergar ele nos mostra o movimento.

Dizem que antes de morrer podemos ver toda a nossa vida que se passou diante de nossos olhos, se assim for estou eu sempre morrendo, mas quem não está?

Masitgo a carne do momento como quem quer tirar o sumo da vida e com ele semear mais vida.

As mudanças conduzem nossos momentos diversos e infinitos, e sempre temos os instantes, posso tocar os sentimentos que me traz a maré, intensos como o mar, tempestuosos e sublimes.

Posso ver o que guardo e carrego comigo, os resquícios dos intantes que se passaram mas se não foram de todo, são parte de mim, fragmentam-me mais e mais a cada sopro de vida. Acendo um cigarro mais e os comtemplo, navegando sem rumo certo nos mares de minha essência.

Li por ai que somos feitos da mesma matéria que os sonhos. Sonhos não têm matéria, mas nós temos vida e talvez com vida preechemos os sonhos. Eu também sou sonho, sou esperança de que os instantes nunca acabem, mesmo que escapem de nossas mãos como água salgada ou doce, sou esperança de que a vida se refaça constamente, e de repente nunca mais esperarei, pois já não serei mais matéria, serei apenas sonho e instantes (infinitos) passados.

Espero até lá poder fazer um bom uso da matéria pulsante em mim, até lá sou também e principalmente, esperança.

Emiliano Alphonsus Coito

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Música do conjunto português Madredeus:


http://www.youtube.com/watch?v=iRbWFC-KAz4

Ainda
Vou dizendo
Certas coisas
Vou sabendo
Certas outras
São verdades
são procuras
Amizades
Aventuras
Quem alcança
Mora longe
Da mudança
Do seu nome
Alegria
Vão tristeza
Fantasia
Incerteza
São verdades
São procuras
Amizades
Aventuras
Quem avança
Guarda o amor
Guarda a esperança
Sem favor...
Ainda
Ainda
Ainda

domingo, 24 de outubro de 2010

Morning Glory




Uma musquinha eletrônica leve soou do celular anunciando o despertar de um dia cheio. Diana ordenou o despertador a tocar uns 10 minutos depois, a função "soneca" lhe é sagrada, sua cama é seu templo e castelo, seu sono é divino. Enfim se levantou, esticou-se e caminhou ao banheiro, encostou a porta, e iniciou seu ritual do amanhecer.

Neil estava de férias, não precisava se levantar naquele momento,e embora já acordado, fingia ainda dormir, adorava observar o íntimo ritual do despertar de sua amada. DO quarto ouvia o barulho das águas e do chuveiro, Diana adora banhos quentes, mui quentes, e logo os perfumes do banho, dos sabonetes, shampus e cremes acariciavam o olfato de Neil, e ele deitado, num sono-acordado, esticava-se, relaxava e gozava o doce da intimidade.

Diana saiu do banheiro, com todo cuidado para encostar a porta novamente com receio de que a claridade não viesse a acordar seu homem, estava com a toalha enrolada em seu corpo, embora cansada,o banho a relaxava como quase nada nesse mundo.

Ainda com o corpo úmido ela deixa a toalha para vestir-se. Primeiro as íntimas, depois a escolha da roupa apropriada, vestido ou calça? Verde ou violeta? E Neil observava o strip-tease ao contrário, e como adorava. Tudo tinha seu lugar e a sua hora, cada etapa com um jeito próprio. No final, já estava um tanto apressada e abria a caixa de jóias e bijuterias para pegar um anel ou um brinco, ou ambos, e todos, a roupa, os acessórios, todos com um propósito, com um fim, exprimiam em sua totalidade um ar, o seu ar naquele dia, parecia dizer para Neil onde iria ela, que iria fazer e como nesta manhã acordara.

Neil fazia um contato vivo e mágico com a personalidade da mulher que amava, e adorava isso, poder participar, mesmo observando, poder compartilhar com sua amada os seus momentos onde ela sentia-se só e livre, e poder degustar a graça, o zelo e a beleza que tinha Diana ao se arrumar quando acordava, como se olhava no espelho para arrumar o brinco e ver se estava de acordo, o toque que passava nos cílios e como ao final de tudo, passava o protetor solar na tatuagem que tem na perna.

Neil levantou-se enfim e de imediato foi carinhosamente repreendido, durma mais, está cedo, disse Diana. Neil iria voltar para cama ainda um pouco, mas não naquele momento, após assistir o seu ritual preferido, gostava de se levantar, preparar algo para que Diana não saisse com o estômago vazio de casa, e também adorava, vê-la engolindo, às pressas, uma xícara de leite quente com capuccino, seguida de um beijo breve, ás vezes mais intenso ás vezes não, e um bom dia amor.

Como Neil gostava de suas férias, quando Diana saia, ele voltava para o quarto que ainda exalava o perfume misturado ao vapor do banheiro, ele deitava novamente na cama e dormia um pouco mais, tranquilo e relaxado como se tocado em Deus ou vigiado pelos anjos.

Gabriel Oliveira

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um texto muito inspirador para este que escrevi é de Xico Sá, colunista do yahoo!:http://colunistas.yahoo.net/posts/60.html

domingo, 17 de outubro de 2010

A bela moça Furtiva

Exatamente ás 14:30 partiu o ônibus da rodoviária, não inciara ali sua viagem, já vinha de longe, de outras cidades, o que chamam de "carro em trânsito". Não houve atrasos nem complicações maiores do que as costumeiras, não estava cheio, não era o início e nem o fim de feriado prolongado quando as pessoas esbarram-se nos terminais.
Na poltrona 21, sentou e acomodou-se Neil. Ao que parecia, por toda a viagem ninguém sentaria ao seu lado e poderia esticar-se da melhor maneira que lhe coubesse. Era um ônibus aconchegante, não havia cheiro de cigarro, de urina ou comida. Ao que tudo indicava seria uma viagem não desagrádavel e, simplesmente, comum.

Do outro lado do corredor, nos assentos ao lado de Neil, debruçava-se sobre a janela a moça.Uma moça bonita, com seus vinte e poucos anos, cabelos longos, pele branca, mui branca, corpo esbelto e roupas comuns.

Neil, bem que tentou, mas não evitou observar a moça, a bela moça, como se não conseguisse apenas olhar, apenas reconhecer que ao seu lado havia uma bela moça, necessitou observá-la, com todo o cuidado que lhe é de costume, não lhe apetece invadir a privacidade alheia, mas era como se a moça ao seu lado lhe roubasse o olhar e a atenção.

Quando ela o olhou, Neil percebeu o por que de tamanha curiosidade, os singelos olhos castanhos da moça (tão claros), pareciam furtar a luz do sol que lhes tocavam, e que depois de furtada a luminosidade da estrela, eles distribuiam com abundância e altruísmo o brilho e aconchego furtados. Neil não é desses de perder o seu lugar no mundo por qualquer moça bonita que passa pela rua a sua frente. Essa viajante ao lado, realmente, parecia lhe furtar a atenção, o sono e os pensamentos.

Podemos ler no dicionário que furtar é subtrair algo alheio sem o uso da força ou da ameaça, e era exatamente isso que a moça ao lado era, uma moça furtiva. Neil, não conseguira piscar o olho e convocar o sono durante a viagem, para não se deixar levar de todo, não se deixar furtar como um todo, leu o livro que estava em suas mãos, sem deixar de, hora ou outra, observar a bela moça.

Por que não conversara com ela? Não se sabe ao certo, imaginamou que ela também lhe furtara a coragem, como se ele não quisesse atrapalhar a moça que parecia não querer ser incomodada, no mundo de hoje, as pessoas tem medo de serem abordadas por estranhos mesmo que estes apresentem a melhor das boas intenções, afinal não é de hoje que a sabedoria popular nos aconselha que de boas intenções o inferno está cheio.

Ela dormiu. Neil não acreditava no que via. Quanta graça, quanta beleza e calma exalava. O pescoço levemente curvado para a esquerda, o corpo (aquele admirável e completo corpo) jogado com tanta leveza no banco do ônibus, parecia jazer num leito celeste, jorrando brilho e paz, e ela dormia, e Neil não se continha, também de alegria e paz.

Notem que a bela moça furtiva, não apenas furtava, mas também distribuia, tal qual uma Hobin Hood contemporânea da beleza e da graça.

Neil tentava não observar a todo momento, não queria despertá-la de seu sono, queria apenas sonhar com o que sonhava a moça, compartilhar com ela tamanha paz que sentia ao fitá-la. Olhava pela janela a estrada e os carros que passavam, um sol castigava o mundo exterior e, tal qual a um sonho, ele não o sentia, dentro daquele ônibus a temperatura mantinha-se a mesma por conta do ar condicionado.

Neil não se continha, começou a poetar o que sentia a observar a moça, mentalmente. Descobria adjetivos e metáforas que lhe cabiam ao fenômeno que observava, e quanto mais poetava, mais se encatava, mais se exaltava interiormente, menos se continha a observar o sono da bela moça furtiva, seus trejeitos, como descansava os braços, como virava para o outro lado deixando-o apenas com o perfil do rosto.

Lá fora começou a chover, infelizmente, Neil não sentia o aroma das águas molhando o asfalto em brasa, mas seu êxtase era tamanho que era como se inspirasse a brisa da forte chuva de verão adiantada, olhou novamente a bela moça furtiva, fechou os olhos e sentiu-se correndo ao lado da grama ao lado da estrada que solene molhava, sentiu-se deitado nela, rolando o corpo na grama, que não pinicava, aconchegava. De olhos fechados, Neil sorria e desejava que a moça ao lado sentisse com ele essa sensação de liberdade e prazer, sinestésica e lisérgica. Como se quisesse sonhar por ela, como desejasse retribuir a paz e alegria por ela distribuida.

Ela acordou, e os olhos castanhos demoraram alguns segundos a exprimir a solenidade de outrora, como se ainda perdidos entre o mundo do sonho e a tangível realidade. Neil não conseguiu conversar com ela, afinal, o que diria? Oi, não sei teu nome, mas vejo tu como uma bela moça furtiva que me furtou o sono, a atênção e os pensamentos. Não soaria tão normal como da maneira que tudo aconteceu, ele iria parecer um galante qualquer, um aproveitador. Não, Neil, não se aproximou.

Pensou que não conseguiria se fazer entender, não seria capaz naquele momento de exprimir todo o respeito e carinho que já adquirira pela graça da bela moça, mas ele queria muito, e como queria, embalar seu sono, tentar de todas as maneiras fazer com que seu gostoso sono jamais terminasse, ou pelo menos dar-lhe um "boa noite" com um beijo de carinho e respeito em sua pele branca e quente entre os seus pequenos seios (e como são acalantosos os sinceros e carinhosos afagos de "boa noite").

Antes da viagem de Neil chegar ao fim, breve e inesperadamente tal como ele entrou, a bela moça furtiva desceu do ônibus. Ele nada disse, nada manifestou, ela se foi. A viagem prossegue.
Neil nunca mais verá a bela moça furtiva, mas de que isso importa? Ela, que passou, lhe furtou o sono, a atenção e os pensamentos, e principalmente, o tédio de uma longa viagem de ônibus.
Ela que vá furtar e distribuir a outros, não sou egoísta, pensou Neil.

Gabriel Oliveira

imagem: "Encruzilhada" de marcelo Taube.
fonte: http://mondomoda.wordpress.com/2009/11/18/exposicao-de-marcelo-taube/
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Como de costume, deixo alguns versos do "poetinha", Vinicius de Morais do livro Antologia Poética.
Poema dos olhos da Amada

Ó minha amada
Que olhos os teus

São cais noturnos
Cheios de adeus
São docas mansas
Trilhando luzes
Que brilham longe
Longe dos breus...

Quanto mistério
Nos olhos teus
Quantos saveiros
Quantos navios
Quantos naufrágios
Nos olhos teus...

Ah, minha amada
que olhos os teus

Se Deus houvera
Fizera-os Deus
Pois não os fizera
Quem não soubera
Que há muitas era
Nos olhos teus.

Ah, minha amada
De olhos ateus
Cria a esperança
Nos olhos meus
De verem um dia
O olhar mendigo
Da poesia
Nos olhos teus.

terça-feira, 12 de outubro de 2010

Imprevisibilidade


A vida também é feita de desencontros, mas é uma sensação muito boa aquela do estar no lugar certo, com a pessoa certa, no momento certo, e muitas dessas coisas não acontecem só por acaso como armadilhas boas do destino.

Os momentos de sonho real não surgem do nada, somos nós os seus arquitetos, somos nós que lançamo-nos ao inesperado, enfrentamos o frio na barriga e na espinha e aceitamos correr os riscos.

Não podemos prever quando viveremos mágicos momentos, em muitos casos até, nada sai como o previsto. Podemos viver ou iniciar uma gostosa aventura em uma conversa despretensiosa em um ônibus, no caminho para o trabalho, em casamentos, e talvez até (pasmem) em velórios.

Vivenciar uma gostosa aventura nos faz ascender aos céus, ou nas palavras de Noel Rosa "sambar de alegria, sorrir de nostalgia". Sentir o prazer de estar vivo, quando menos se espera, experimentar a parte alegre da imprevisibilidade e lançar-se em mares desconhecidos e prazerosos sem instrumentos de navegação provoca-nos uma explosão de vida, sentimo-nos portadores de uma potência sobre-humana e capazez de guiar o leme de nossas vidas por onde e como quisermos.

E como é bom. É como estar de carona com Neil Cassidy no México ou nas experiências de Thimoty Leary e ter, naquele momento, as chaves para todas as respostas do mundo!

Mas, a viagem tem um final (ou finais) e seus efeitos alucinógenos também. Da mesma maneira que não escolhemos todas as vezes que seremos apanhados a ter a possibilidades de viver gostosas sensações, também escapa de nossas mãos o controle de manutênção das mesmas sensações. Não é suficiente apenas boa vontade e força para guiarmos o barco, é necessário bons ventos, da mesma maneira que não apenas o amor incondicional é suficiente para a manutênção de uma boa relação.

Enfim, o destino nos convida a viver bons e únicos momentos, depende de nossas forças, vontade, sonho e uma boa pitada de coragem para que possamos vivenciar realmente o que nos aparece apenas como possibilidade, e depois somos apanhados novamente pelo curso natural das coisas e pelo instranponível tempo que nos faz acordar, voltar a realidade, pousar os pés ao chão e voltarmos aos mares de outrora, ou outros, e essas sensações por mais memoráveis que sejam, vão almotoando-se como memórias.

As infinitas possibilidades, garantida pela inerente imprevisibilidade da vida humana nos demonstra que temos uma certa gama de escolhas, que podemos escolher lutar para viver certos momentos ou não, que temos certo poder nos rumos que tomamos. Entretanto, a mesma imprevisibilidade também pode nos jogar às pedras ou aos tubarões, ou simplesmente terminar com o que é bom, com o sonhos, com os bons ventos.

Podemos, então, a partir disso, concluir que a imprevisibilidade também é uma condição humana. E se assim pensamos, apesar de termos a predisposição para temer o que é desconhecido, muitas vezes devemos nos lançar a este, alçar alto as velas, olhar nos olhos, encarar o que queremos ( e também tememos), encher o peito e lutar não apenas para prolongar as boas sensações, mas principalmente para podermos viver todos os bons momentos a que tivermos a possibilidade, para saborearmos todos os chocolates, do doce ao amargo, para imortalizar e eternizar (mesmo que sejam finitos e breves) os bons momentos. Antes que nossa vida anoiteça!
Gabriel Oliveira
------------------------------------------------------------------------------------------Alguns versos conhecidos de Vinicius de Moraes


Soneto de Separação


De repente do riso fez-se o pranto
Silencioso e branco como a bruma
E das bocas unidas fez-se a espuma
E das mãos espalmadas fez-se o espanto

De repente da calma fez-se o vento
Que dos olhos desfez a última chama
E da paixão fez-se o pressentimento
E do momento imóvel fez-se o drama

De repente não mais que de repente
Fez-se de triste o que se fez amante
E de sozinho o que se fez contente

Fez-se do amigo próximo, distante
Fez-se da vida uma aventura errante
De repente, não mais que de repente"

"Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure."

domingo, 10 de outubro de 2010

Emiliano, um peixe grande




Os fins de semana! Aqueles dias que muitos esperam para recuperar as energias, para divertir e cometer loucuras, para econtrar com família e/ou amigos, ou, simplesmente para ficar em casa, com as pernas para o ar vendo os minutos passarem sem assim se preocupar.

Há finais de semana em que Emiliano Alphonsus não sai de casa. Não pense você, logo de primeira impressão que nosso referido personagem é uma pessoa anti-social, pois não seria esta uma análise bem detalhada. Tem muitos amigos, tem boas relações com as pessoas com quem convive, acredita que é melhor conviver bem com as pessoas do que semear conflitos desnecessários, e além disso, é um cara sorridente, amigo, ou como por aí chamam: "boa praça".

Mas, há finais de semana em que Emiliano não sai de casa. Sexta, sábado e domingo passa em sua caverna. Emiliano mora sozinho, se bem que, como uma boa pessoa boa em fazer amigos, não podemos dizer que Emiliano mora totalmente só, ele tem lá suas companhias breves e passageiras, ou não.

Mas, neste final de semana, Emiliano não conversou com ninguém. Nem mesmo encontrou Giselda, a perereca, de madrugada no banheiro, ou Tina, a branca largatixa, pedunrada na parede preocupada em se esconder e comer insetos, e até mesmo Clotide, a bicicleta, estava
quebrada e não serviu de companheira em pedalas furtivas pela madrugada.

O leitor atento e curioso pode-se perguntar o que faz, nesses finais de semana nosso personagem. Devemos admitir que Emiliano não é bem um cara hiperativo, possui até o que chamam de "lerdeza" em fazer coisas, uma certa não-pressa, como se tivesse vontade de degustar os momentos que passam e ações que faz. Mas, Emiliano faz coisas, não é de ficar muito tempo parado no mundo esperando alguma coisa acontecer, e mesmo quando parado, aparentemente inerte, Emiliano faz algo, estejam certo disso.

Nesse final de semana, nem as plantas e flores do jardim Emiliano regou. Há duas semanas atrás que o tempo mudou, a chuva, enfim, apareceu após três meses de exílio e Emiliano não viu mais a necessidade de regá-las todos os dias, como estava de costume. Nessa estiagem última, Emiliano por todos os dias que podia regava seu jardim, composto de flores amarelas, vermelhas, rosas, além de outras árvores que não sabe nem os seus nomes, a casa em que mora é de aluguel, não foi ele quem as plantou, mas gosta de vê-las vigorosas e apaixonantes. Regava o jardim todos os dias, ás vezes ficava mais de meia hora, observando, brincando com as cores, o verde, a água da mangueira e sua velha máquina digital. Tirava fotos, fazia filmes, adorava sentir, em meio aquele ar seco e desértico da cidade a gostosa sensação do verde molhado, da terra úmida, ás vezes era tão bom que não queria sair do jardim, queria mais é ficar ali, regando, brincando, esquecer do tempo e enfiar o nariz na terra molhada. Mas, nem isso mais Emiliano fez esse final de semana. Caiu tanta água nos últimos dias que passaram que temeu que mais água fizesse mal a suas queridas amigas verdes.

Saiu apenas no Domingo a noite. Estava com fome e não queria sua própria comida. Em alguns finais de semana como esse, Emiliano não sai sem seu fone de ouvido e o celular repleto de músicas que ele conhece e gosta. Como Clotilde estava inapta, foi a pé, como a muito tempo não fazia. Foi caminhando, ouvindo música, com as mãos aos bolsos do short, num caminhar sóbrio e tranquilo como é de costume de nosso personagem.

Pediu o lanche e uma cerveja, lata, brahma. Sentou-se, em uma mesa, em frente ao lanche na praça de seu bairro. Quando Emiliano está nesses finais de semana "de caverna" ele não tem tanta vontade de conversar, prefere mais é observar. Com o fone nos ouvidos, não presta a atênção na televisão que passa, acho que nem está tão interesssado na música que ouve. Ele vê, e não apenas vê, ele observa o mundo que se passa ao redor. Observa as pessoas, e como tem curiosidade pelas suas ações.

E ficou observando as pessoas que sairam naquele domingo, naquele final de semana, e como tem interesse nelas, como acha curioso aqueles que saem de casa para relaxar da semana exaustiva que passou, ou os que saem de casa para realmente conversar com a família ou amigos, os namorados explodindo de hormônios e desejos guardados, há aqueles até (menos afortunados) que saem no domingo a noite para trabalhar. E Emiliano adora observar.

Por favor, não entenda nosso personagem como uma pessoa "reparadeira", que gosta de observar os defeitos e mal hábitos das pessoas, o que lhe interessa mesmo são os modos, as sutilidades, as maneiras de relacionamento e os mundos possíveis que se pode imaginar ao observar as pessoas na rua.

Como tem dúvida a senhora que permanece mais de 15 minutos, imóvel, com o cardápio na mão, escolhendo o quer comer, ou como soa entediante para o garoto ajudar o pai em seu trabalho em pleno domingão, ou a feição tensa e até raivosa da moça que senta ao lado do namorado sem querer muita conversa. O que teria feito ele? Estaria ela, realmente com raiva dele, ou da mãe ou pai? Emiliano não tem tais respostas, mas adora as perguntas, simplesmente adora.

Ele parece observar as pessoas como num imenso e móvel aquário, como se fossem peixes convivendo num habitat cercado. E assim, fica a observar as ações, as feições, os trejeitos, alguns tão sem jeito, outros sem modos, fica a imaginar seus mundos, o mundo a que cada um pertence, os mares onde cada um veio e como assim vivem. Como já dito, ele não tem certeza de nada do que pensa sobre essas pessoas, nem tão pouco é de fazer conclusões ou julgamentos, Deus o livre disso.

Mas ele fica observando os peixes que nadam, cada um com um nado diferente, uma preocupação e natureza própria, e acha tão mágico observar e tentar fazer teorias ciêntíficas à base de uma observação metodológica.

Ás vezes passa pela cabeça de Emiliano que o peixe é ele, e é ele quem vive num áquario gigante e móvel, onde ninguém o toca, ninguém com ele nada, mas ele tudo observa, de dentro pra fora, de sua água para o mundo exterior, e como é curioso o mundo fora do aquário. Entretanto, se peixe mesmo for Emiliano, não é um do tipo comum, Emiliano é um peixe grande, um peixão, impescável, único e solitário.

Gabriel Oliveira

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Deus, a solidão e a condição humana



As pessoas, em geral, tem tanto medo, não que eu também não tenha. As pessoas tem medo de não acreditar em Deus. As pessoas tem medo da solidão.


Eu não. Já me acostumei, desde a infância, a conviver com a idéia de que somos sós, de que não há meios humanos para fugir da condição humana.


Eu poderia acreditar em Deus, confortar-me com a idéia de que há um plano maior para mim, que eu faço parte dos desígnios Dele, mas isso nunca me coube. Como, me pergunto, acreditar em Deus?


Alguns poderiam me responder que não haveria meios da natureza ser tão bela e perfeita, da mulher que passa (e passou) ser tão maravilhosa, do ser humano existir e ter vida
pulsante em suas veias, da vida ser cheia de "miraculosos" acontecimentos e que isso tudo que é o nosso mundo, poderia, apenas, ser obra divina.


Mas não, não me cabe. A beleza é real, a vida é real. Acho que sou muito prático e não gosto de perder tempo em me preocupar se isso, se tudo isso, foi feito por um cara no céu que chamamos ser superior. Ao contrário quero ver,viver, sentir a beleza, a vida, a tristeza e tudo mais que é intrincado e inerente à vida humana.


Somos breves, passamos simplesmente. Podemos deixar vestígios, marcas ruins ou boas. Podemos pensar que o momento é eterno, que o presente é um presente, e que o tempo não nos prende e que viveremos eternamente, como o momento, e que a morte não existe, pois não há como assassinar o que é eterno. Isso também é confortante. Mas ainda não me cabe.


Assim como não temo ter apenas uma vida, não temo ser só. Não que eu seja forte, uma rocha ou uma ilha, também assim não sou. Mas não temo ser quem sou. Ser só não me faz feliz, mas a não-felicidade também não me amedontra. Relacionamo-nos com as pessoas para suprir fraquezas, medos e inseguranças, e muitos passsam a vida inteira pensando que é real a arquitetada segurança. O conforto que adquirimos com os outros é tão construído e ilusório como a segura e cômoda idéia de existência de Deus.


Argumentem que pode tudo até ser, sim, meras construções humanas para preencher os medos e vazios causados pela insegurança da existência, uma ilusão da nossa psiquê e da sociedade
para melhor vivermos, ou vivermos mais felizes, mas mesmo assim é uma boa ilusão e, assim, fico eu sem argumentos, pois eu também construo ilusórias seguranças para me manter aqui sentado em frente ao computador escrevendo. Talvez, seja uma forma de não me sentir tão só, eu acredito que sim.


Nunca disse que gosto de ser só. Mas não gosto de fugir da condição humana, não me agrada negar que a vida é breve e única, que Deus não a criou e não tem para ela um plano maior, e que se a morte é a única certeza que temos, também sei que sou eu a única pessoa que estará comigo até o fim.


Vivemos(bem ou mal) sem Deus, sobrevivemos sós(com nossas próprias forças) e ainda permanecemos vivos, respirando no seio da não-felicidade. Somos humanos, somos fracos, mas sabemos resistir (alguns), não sem dores e machucados, mas não podemos fugir da dor, não devemos temê-la. Não tenhamos medo das perguntas sem respostas, da angústia existencial, dos confrontos de mundos e opniões, dos ferimentos da vida, da indivudalidade e da solidão desta, pois não devemos negar a nossa condição, somos humanos.


Talvez, assim, não sejamos tão felizes e não chegaramos a construir altos castelos de cartas, mas também não teremos nossas individualidades e razões atrofiadas e resignadas.
A vida segue seu rumo e cada um escolhe os seus mares navegantes.

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Para variar encerro com um pensamento do eterno José Saramago, que não foi ao céu ou ao inferno, mas plantou frutíferas árvores em seu presente, e um pensamento de Caio Fernando de Abreu.


"Não sou pessimista. O mundo é que é péssimo" e "Não sou um ateu total, todos os dias tento encontrar um sinal de Deus, mas infelizmente não o encontro" J. Saramago

"Os homens precisam da ilusão do amor da mesma forma como precisam da ilusão de Deus. Da ilusão do amor para não afundarem no poço horrível da solidão absoluta; da ilusão de Deus, para não se perderem no caos da desordem sem nexo." C.F.A.

Gabriel Oliveira